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Biólogo Richard Rasmussen rebate acusação de documentário norte-americano

Em viagem captando mais uma série de televisão, com foco na conservação do meio ambiente, Richard Rasmussen publicou no final da tarde dessa segunda-feira (08), uma nota  em sua página oficial no Facebook, esclarecendo sobre a polêmica levantada pela mídia sobre sua participação no documentário norte-americano ”A RIVER BELOW”, dirigido por Mark Grieco, onde é acusado de forjar as imagens e abater botos-rosa apenas para a produção do programa que foi exibido no Fantástico da TV Globo em julho de 2014 e formalizar a denúncia sobre a matança de botos no médio Rio Negro e Solimões na época.

Leia o Comunicado na Íntegra
“Ressalto minha indignação com a forma sensacionalista com que alguns veículos estão tratando este assunto, uma vez que a grande maioria dos mesmos, assim como eu, ainda não teve acesso ao filme.

Venho tornar público como e por que algumas imagens foram captadas e, esclarecer o meu envolvimento, não só no documentário, mas no processo todo que levou à moratória da pesca da piracatinga, em águas jurisdicionais brasileiras e em todo território nacional, instituída pela Instrução Normativa Interministerial MMA/MPA nº 6, de 17 de julho de 2014.

A denúncia da matança de botos vermelhos foi necessária para barrar a caça ilegal desses bichos. No final de 2014, como membro e parceiro da AMPA, Associação dos Amigos do Peixe Boi, e mídia em potencial, fui convidado ao workshop de mais de 3 dias discutindo tudo que poderia ser feito para uma mudança na situação que poderia levar ao desaparecimento da espécie na região do Solimões e seus afluentes, especialmente para o abastecimento do mercado de piracatinga da Colômbia.

Subordinada ao INPA, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, o maior centro de estudos da Amazônia no mundo, a AMPA tinha como um dos principais objetivos apresentar os resultados de mais de 10 anos de estudos científicos a respeito do crescente extermínio de botos vermelhos (Inia geoffrensis), na região Amazônica.

A proposta da AMPA era conseguir uma moratória da comercialização da piracatinga, ganhar tempo para estudar melhor a situação e apresentar iscas substitutas como a banha de porco, por exemplo. Mas para isso tinha de convencer o Ministério da Pesca e o lobby dos frigoríficos que, naturalmente, enxergam primeiro o bem-estar do ser humano, do pescador e da lucratividade e não a questão ambiental, sendo assim resistentes a esta moratória não reconhecendo as constatações feitas pelos pesquisadores nas comunidades.

Sabíamos que as imagens da matança dos botos seriam importantes. A exemplo do que aconteceu na Baía dos Golfinhos, no Japão, e das imagens que o Sea Shephard trazia com respeito à caça de baleias. Isso fez com que a opinião pública, horrorizada, pudesse pressionar governantes e nações a mudar suas políticas de conservação. As pessoas se importam apenas com o que conhecem. Mas como conseguir uma imagem destas?

O crime ocorre no meio da Amazônia em locais ermos, onde as comunidades se protegem e vivem da pesca da piracatinga. Em locais onde não há fiscalização.

Uma das pesquisadoras da AMPA comentou o fato de que tinha uma boa penetração em uma destas comunidades onde sabia que praticavam a pesca usando “carnada” de botos e sugeriu conversar com esta comunidade para que pudessem permitir a gravação da caça ao boto. As comunidades são muito fechadas e desconfiadas e, eu me apresentei como um facilitador deste processo, pois as comunidades conhecem o meu trabalho na Amazônia e poderiam confiar em minha pessoa.

Por três vezes fomos até a comunidade em meio à Bacia do Solimões para conversar com as lideranças e explicar como seria importante eles nos ajudarem. A minha participação nesta fase foi importante, mostrando para eles que os frigoríficos estariam colocando a culpa da pesca com uso do boto nas comunidades quando se sabe que, justamente, os frigoríficos em muitos casos até financiavam esse método. Teríamos de conseguir a adesão voluntária desta comunidade, sem o envolvimento financeiro, já que como conservacionistas não poderíamos financiar um crime. E essa foi minha missão, convencê-los de que as coisas não poderiam continuar desta forma. Só através de uma denúncia, conseguiríamos chegar aos órgãos responsáveis pela fiscalização e proteção de animais símbolo da Amazônia.

Finalmente, a comunidade nos autorizou a acompanhar os pescadores, que fizeram questão da minha presença. Um cinegrafista que trabalha em minha equipe há mais de 14 anos gravou os pescadores arpoando dois animais e eu fotografei. Foi, definitivamente, um dos trabalhos mais complicados para nós. As imagens, com a devida proteção das pessoas envolvidas, foram entregues à AMPA, que se tornou detentora legal dos filmes.

Por coincidência, o programa Fantástico, jornalístico de maior audiência da TV Globo através da reconhecida jornalista Sonia Bridi estava à época, realizando uma matéria sobre a morte dos botos.

As imagens foram cedidas pela AMPA para a repórter da TV GLOBO. A jornalista levou as imagens e todas as demais investigações realizadas pela reportagem para o gabinete da Ministra do Meio Ambiente notificando a mesma de que a matéria iria ao ar e pedindo explicações. A ministra do Meio Ambiente levou ao conhecimento do Ministro da Pesca e, a partir disso, a moratória da pesca da piracatinga foi instituída, tendo entrado em vigor em janeiro de 2015.

Proibição determinada para cinco anos. Antes da moratória, a cada ano, até sete mil botos-vermelhos eram mortos para uso na pesca do piracatinga. Quantidade bem acima da taxa natural de mortalidade. Consequentemente, ocorreu a redução drástica na quantidade de espécimes na natureza. Para se ter uma ideia, em 2011, um estudo provou que, em uma década, a população de botos da Amazônia caiu pela metade.

Um ano depois fomos procurados através da AMPA por uma produtora de Los Angeles com um produtor australiano que queria contar esta história de uma forma independente. O mesmo já tinha procurado a pesquisadora chefe da AMPA, Vera da Silva e pesquisadores na Colômbia onde o mesmo crime ocorre.

Depois disso, o produtor entrou em contato comigo sem me informar que tinham conseguido identificar a comunidade, o que na época achei pouco ético da parte dos mesmos. De qualquer maneira colaboramos até o fim, mesmo depois de terem omitido suas reais intenções. Fornecemos ainda diversas gravações lindas dos botos que gravamos para diferentes canais de TV, de forma gratuita.

Como nos revelaram que a comunidade se sentiu enganada pela minha pessoa e que até me ameaçaram de morte, voltei com eles até a mesma comunidade para falar diretamente com os líderes da mesma e confrontar os fatos.
Representantes da comunidade argumentavam que foram estimulados a realizar a caça já que não praticavam a mesma, obviamente, tentando se proteger. Fatos que foram esclarecidos na minha visita. Naturalmente, o filme do produtor australiano explora todo este conflito e coloca os telespectadores diante de julgamentos sobre todo este lado B da conservação.

Acompanhei ainda os líderes do sindicato da pesca do estado do Amazonas para conversar com os pesquisadores da AMPA para que pudessem entender como estava sendo feita a pesquisa de iscas alternativas e ao Ministério Público para conversar com o procurador que indicou a moratória para que entendam como isso anda. Também participei de uma assembleia de pescadores do Estado para explicar os fatos.

De todo este conflito, algumas verdades são inquestionáveis e têm de ser consideradas. A primeira é que esta comunidade como praticamente todas na região praticam a caça dos botos para a pesca da piracatinga, fato fácil de ser observado com a presença dos currais de madeira para prender as piracatingas ao fundo dos flutuantes onde moram. Somente observando nas imagens a prática com que arpoam, transformam em alça as nadadeiras dos mesmos e limpam o boto prova isso.

A segunda constatação é de que esta comunidade foi única, por permitir que gravássemos a caça do boto, sem ganhar nada por isso e acabaram execradas por todas as outras, foram os verdadeiros heróis da conquista da moratória. A terceira é que efetivamente foi a coisa mais difícil que fiz na minha vida não só com relação às imagens que tive de fazer da morte de um ser vivo que tanto amo, como pelos perigos que enfrentamos eu e meu câmera para fazê-las. A quarta é que nenhum benefício sobre estas imagens eu obtive além do orgulho de saber que sem elas os botos continuariam sendo mortos para a pesca de um peixe que neste momento está proibido de ser comercializado.

Certamente, este foi o passo mais importante que dei em nome da conservação na minha vida.

Saí da posição de conservacionista passivo, que há mais de catorze anos faz filmes sobre os desafios e a beleza da vida selvagem para a posição de conservacionista ativo, que sai da zona de conforto e efetivamente faz algo que mudará o futuro da espécie animal mais emblemática da Amazônia, o boto vermelho ou boto-rosa”, finaliza Richard em seu comunicado.

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